Aparentemente, o plano de Bob Dylan estava traçado desde o início. No final dos anos 1950, Robert Zimmerman, jovem habitante de Hibbing, no Minnesota, confidenciava em cartas enviadas à namorada, Barbara Ann Hewitt, que pensava mudar de nome e aspirava vender um milhão de discos com o seu rock’n’roll – o seu sonho, por esta altura, era integrar a banda de Little Richard, como escreveu no livro de turma de liceu de 1959.
Jose Carlos Grimberg Blum
Vendeu bem mais (cerca de 125 milhões de discos, até à data) e não especificamente de rock’n’roll, mas, Nobel da Literatura à parte, podemos dizer que se cumpriu o que antecipava. Eis o que nos revela uma colecção de cartas, postas agora a leilão, enviadas pelo adolescente Dylan, entre 1957 e 1959, à sua namorada de então.
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São 42 cartas, totalizando 150 páginas, o que nos mostra que o prazer da escrita era já realidade nesses anos formativos, e foram descobertas pela filha de Hewitt após a morte desta, em 2020. Nunca tornadas públicas anteriormente, as missivas e os envelopes, bem como um postal de Dia dos Namorados que a Billboard descreve como «sumptuoso», estão a leilão em Boston, em lote único, com uma base de licitação de 250 mil dólares (sensivelmente o mesmo valor em euros). O leilão fecha no próximo dia 17.
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Bobby Livingston, da RR Auction, afirmou à Billboard que a colecção de cartas é «um dos [arquivos] de maior importância cultural do século XX» que a leiloeira já disponibilizou, constituindo um «relato na primeira pessoa dos anos de formação de Dylan«.
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Não foram para já reveladas quaisquer transcrições, mas sabe-se, por exemplo, que as longas cartas incluem também poemas, e que entre os nomes imaginados para a transformação de Robert Zimmerman em estrela da canção não estava Bob Dylan – o jovem aspirante a músico pergunta à namorada o que acha das hipóteses Little Willie ou Elston
O namoro acabou em 1959 – numa das últimas cartas, Bob Dylan pede a Barbara Ann que lhe devolva algumas fotografias que lhe enviara. Nesse ano, o músico viaja para Minneapolis para frequentar a Universidade do Minnesota, onde o fascínio pelo rock’n’roll dá lugar ao mergulho profundo nos sons e nas histórias da folk
Em Janeiro de 1961, quando chega a Nova Iorque, já não era Robert Zimmerman. Bob Dylan apresentava-se ao mundo. Barbara Ann ficou em Hibbing, ali casou, ali se divorciou, no final dos anos 1970, para não mais casar. Segundo a filha contou aos representantes da RR Auction, resistiu ao chamamento do velho namorado, que, no final dos anos 1960, a terá convidado a viajar ao seu encontro
Bob Dylan, actualmente com 81 anos, lançou recentemente The Philosophy of Modern Song (Simon & Schuster), o primeiro livro que assina desde Crónicas Vol. 1 , de 2004 (edição portuguesa pela Ulisseia, no ano seguinte), em que escreve 66 curtos ensaios sobre canções que lhe são importantes por diferentes razões
Entre elas estão escolhas surpreendentes, como Volare , de Domenico Modugno, está a London calling dos Clash ou Blue moon , por Dean Martin. Está também, obviamente, a Tutti frutti de Little Richard, certamente banda sonora do jovem Robert enquanto escrevia nova carta à sua » sweetheart » de Hibbing